Após quase dois meses de suspensão, na última sexta-feira a Secretaria de Estado da Saúde autorizou a retomada, de forma parcial, das cirurgias eletivas no Paraná. A medida tem o objetivo de diminuir as filas que naturalmente se formaram no estado (assim como no restante do país) em função da crise causada pelo novo coronavírus. Neste primeiro momento, porém, a retomada ainda deve acontecer de forma lenta e com muitas restrições, o que implicará, possivelmente, na necessidade da realização de, por exemplo, mutirões nos próximos meses.
Conforme dados do Ministério da Saúde, entre março e junho, primeiros meses da pandemia, o Paraná fez cerca de 29 mil procedimentos eletivos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o que significa uma queda de 55,15% na comparação com o mesmo período do ano passado, quando haviam sido realizados quase 65 mil cirurgias desse tipo. A queda foi ainda mais significativa do que a verificada a nível nacional, de 47,5% — no Brasil, foram feitos 453 mil procedimentos nesses quatro meses, ante 862 mil em 2019.
No Paraná, as cirurgias eletivas estavam suspensas desde o dia 24 de julho, quando a Sesa divulgou a Resolução número 926/2020. Desde então, vinham sendo realizadas apenas cirurgias de urgência e emergência, com o objetivo de evitar o uso de medicamentos anestésicos e relaxantes musculares. Àquele tempo, os casos de Covid-19 estavam em acelerado crescimento no estado e havia risco de desabastecimento de alguns fármacos.
Na última sexta-feira, contudo, saiu uma nova Resolução da Sesa (número 1026/2020), a qual sugere que sejam suspensos apenas os procedimentos que demandem terapia intensiva no pós-operatório e/ou em pacientes sob anestesia geral (procedimentos de cardiologia, oncologia e nefrologia não se aplicam). A medida atende pedido do Conselho Regional de Medicina (CRM-PR), feito depois de ouvidas diversas especialidades médicas.
A despeito da fila formada ao longo dos últimos meses, contudo, a expectativa ainda é de uma retomada lenta, ao menos neste primeiro momento, conforme explica Roberto Issamu Yosida, presidente do CRM-PR.
“O procedimento eletivo tem todo um processo. Não é de hoje para amanhã que acontece e alguns fatores importantes vão regular esse retorno”, diz o médico. “Um deles é que, com a questão de prevenção de contaminação, os procedimentos vão ser realizados em menor número. Também vai ter um custo maior, decorrente do uso de mais EPIs, uma taxa de ocupação menor. E ainda tem a própria demanda, pois o paciente vai ter receio de se submeter a um procedimento em hospitais que atendem procedimentos eletivos e Covid-19.”
Na sequência, entretanto, já se reconhece que haverá a necessidade de readequação do sistema, com a adoção de medidas extraordinárias para conseguir lidar com toda a demanda represada. “Não sabemos ainda, porém, como as secretarias estaduais e municipais vão fazer isso. Hoje existe uma contratualização com os hospitais que define meta de qualidade e quantidade de procedimentos. Devemos ter ações pontuais de mutirão na medida que a Covid passar”, aponta Flaviano Ventorim, presidente da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná (Femipa).
Nas clínicas estéticas de Curitiba, procura começa a aumentar
Com a nova resolução da Sesa-PR, e a adoção de uma nova bandeira pela Prefeitura de Curitiba, as clínicas de cirurgia plástica já iniciaram o processo de retomada dos procedimentos e alguns consultórios já sentem aumento da procura por parte dos pacientes.
Conforme a a regional paranaense da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), as clínicas tem dado preferência a utilizar anestésicos como xilocaína e procaína, que não são utilizados para entubação, para anestesia loco regionais ou peri durais.
Conforme Alfredo Duarte Silva, presidente da regional Paraná da SBCP, o setor ficou totalmente parado desde o final de julho. Nas últimas semanas, com o arrefecimento da crise sanitária e os sinais de que o pico da Covid-19 teria passado, teve início o diálogo para reabertura, até mesmo em face das dificuldades financeiras que as clínicas estão enfrentando.
Em outros países, como Estados Unidos, Austrália, Japão e Coreia do Sul, o período de pandemia acabou provocando um aumento no número de pessoas buscando tratamento.
Basicamente, os pacientes estariam se aproveitando do fato de estarem trabalhando em casa (home office), utilizando máscaras e/ou isolados socialmente para dar um retoque no visual. No Paraná, isso chegou a acontecer entre o final de maio e o começo de junho, mas as medidas restritivas acabaram freando a demanda. Agora, a expectativa é de um ‘boom’ na demanda.
“A demanda está muito reprimida, tanto na área de reconstrução como na área estética. Então é possível que tenhamos até dificuldade para encontrar espaços cirúrgicos, vai ser impressionante o número de pacientes aprisionados, segurando para ir no médico e que vão voltar com vontade de fazer logo [a cirurgia]”, afirma Alfredo Silva.
‘Ainda estamos sob tensão’, alerta CRM-PR
Presidente do CRM-PR, Roberto Yosida explica que o Conselho já solicitou à Sesa um estudo mais detalhado para a retomada progressiva dos procedimentos eletivos, até que a integralidade das cirurgias estejam liberadas. Segundo eles, algumas áreas, como as cirurgias oncológicas, não sofreram tanto represamento no período de mais restrições em face da pandemia, enquanto outras, como procedimentos estéticos e ortopédicos, tiveram impactos mais significativos.
Caberá, então, aos próprios médicos decidir, dentro dos limites impostos pela regulamentação legal, em quais situações os pacientes devem ou não realizar o procedimento eletivo, a partir da análise da gravidade e emergência ou urgência de cada uma das situações que se apresentam.
Por outro lado, o CRM também faz questão de ressaltar que ainda será necessário, durante um bom tempo, a adoção de cuidados especiais, tanto na questão de prevenção de contaminação como na realização de novos procedimentos. “[Devemos ter esses cuidados] porque podemos ter um novo surto, uma nova onda [de Covid-19]. Ainda não tem uma folga, mesmo em relação aos farmácos. Ainda estamos sob tensão”, reforça Yosida.
Procedimentos eletivos realizados por ano de atendimento
(dados de março a junho de cada ano)
Brasil
2020: 452.917
2019: 862.640
2018: 838.122
2017: 745.257
2016: 770.243
Paraná
2020: 29.139
2019: 64.977
2018: 61.606
2017: 54.100
2016: 54.184
Fonte: Ministério da Saúde – Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS)