V.A.S, de 51 anos, residente em Apucarana (norte do Paraná), é apenas mais uma pessoa entre tantas que já caíram na armadilha das drogas. Hoje ele luta contra dependência do crack, após ter sido preso três vezes, a última delas na região oeste do Paraná, quando trazia maconha da Tríplice Fronteira para Apucarana. “Muitos jovens acham que o uso de drogas é passageiro e que os dependentes podem sair do buraco quando querem. A história não é bem assim. Entrei no tráfico para sustentar meu vício e acabei no inferno, principalmente depois que conheci o maldito crack. Fiquei preso vários anos, perdi emprego (ele conta que trabalhou na Prefeitura de Apucarana), família, dinheiro, dignidade e a moral. Meus dentes se deterioram junto com minha auto-estima e em alguns momentos cheguei a pensar em tirar a própria vida”, conta.
Hoje o apucaranense luta para vencer a depressão decorrente da abstinência da ‘pedra maldita’. “Não é nada fácil, mas lutarei até minhas últimas forças para sair dessa, porque nenhum ser humano merece viver sob o medo e a depreciação que essa porcaria provoca em quem a consome. Os jovens podem até pensar que maconha não faz mal, mas o primeiro ‘baseado’ que eu fumei foi a chave da porta de entrada para esse mundo infernal das drogas”, adverte.
Recém-saído da prisão e desempregado, V.A.S. hoje reside com uma irmã em Apucarana que o acolheu. “Prometi a Deus, à minha irmã e a mim mesmo que sairia dessa e não vou desistir de lutar contra meus impulsos para conseguir o livramento da droga, apesar da depressão monstruosa provocada pela abstinência dessa “pedra do diabo”. Só quem ficou escravo do vício pode entender o sofrimento de um dependente químico, mas tenho fé que ainda vou arrumar um novo trabalho e juntar os cacos do que sobrou da minha vida”, afirma em tom melancólico.
O que é o crack?
O crack é uma droga feita a partir da mistura de cocaína com bicarbonato de sódio geralmente fumada. É uma forma impura de cocaína e não um sub-produto. O nome deriva do verbo “to crack”, que, em inglês, significa quebrar, devido aos pequenos estalidos produzidos pelos cristais (as pedras) ao serem queimados, como se quebrassem.
A fumaça produzida pela queima da pedra de crackchega ao sistema nervoso central em dez segundos, devido ao fato de a área de absorção pulmonar ser grande e seu efeito dura de 3 a 10 minutos, com efeito de euforia mais forte do que o da cocaína, após o que produz muita depressão, o que leva o usuário a usar novamente para compensar o mal-estar, provocando intensa dependência. Não raro, o usuário tem alucinações, paranóia (ilusões de perseguição).
Em relação ao seu preço, é uma droga mais barata que a cocaína. O uso de cocaína por via intravenosa foi quase extinto no Brasil, pois foi substituído pelo crack, que provoca efeito semelhante, sendo tão potente quanto a cocaína injetada. A forma de uso do crack também favoreceu sua disseminação, já que não necessita de seringa — basta um cachimbo, na maioria das vezes improvisado, como uma lata de alumínio furada, por exemplo.O crack eleva a temperatura corporal, podendo causar no dependente um acidente vascular cerebral.
Destruição de neurônios
“Essa droga também causa destruição de neurônios e provoca a degeneração dos músculos do corpo (rabdomiólise), o que dá aquela aparência característica (esquelética) ao indivíduo: ossos da face salientes, braços e pernas finos e costelas aparentes. O crack inibe a fome, de maneira que os usuários só se alimentam quando não estão sob seu efeito narcótico. Outro efeito da droga é o excesso de horas sem dormir, e tudo isso pode deixar o dependente muito debilitado e vulnerável a doenças”, alerta o psiquiatra, intensivista e médico legista Narciso Marques Moure.
Ele frisa que o crack é seis vezes mais potente que a cocaína e tem ação devastadora, provocando lesões cerebrais irreversíveis e aumentando os riscos de um derrame cerebral ou de um infarto.
Droga extramente viciante
Segundo Narciso, com apenas três ou quatro doses, às vezes até na primeira, o usuário de crack se torna completamente viciado na droga. Normalmente o dependente, após algum tempo de uso do tóxico, continua a consumi-la apenas para fugir do desconforto da síndrome de abstinência — depressão, ansiedade e agressividade.
O psiquiatra ressalta ainda que após o uso, a pessoa apresenta quadros de extrema violência, agressividade que se manifesta a princípio contra a própria família, desestruturando-a em todos os aspectos, e depois, por consequência, volta-se contra a sociedade em geral, com visível aumento do número de crimes relacionados ao vício em referência.
Segundo Moure, o uso do crack — e sua potente dependência psíquica — frequentemente leva o usuário à prática de delitos, para obter a droga. Os pequenos furtos de dinheiro e de objetos, sobretudo eletrodomésticos, muitas vezes começam em casa.
Só com a roupa do corpo
“Muitos dependentes acabam vendendo tudo o que têm a disposição, ficando somente com a roupa do corpo. Em alguns casos, podem se prostituir para sustentar o vício. O dependente dificilmente consegue manter uma rotina de trabalho ou de estudos e passa a viver basicamente em busca da droga, não medindo esforços para consegui-la. O crack pode causar neurofilexia e doenças reumáticas, podendo levar o indivíduo a morte” adverte Narciso.
Chances de recuperação
As chances de recuperação dessa doença, que muitos especialistas chamam de “doença adquirida” (lembrando que a adicção não tem cura), são muito baixas, pois exige a submissão voluntária ao tratamento por parte do dependente, o que é difícil, haja vista que a “fissura”, isto é, a vontade de voltar a usar a droga, é grande demais.
Com informações do portal Índice de Saúde