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“Com restrição ao emprego informal, mercado de trabalho tem cenário inédito – e dramático

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“A quantidade de pessoas que solicitaram o auxílio emergencial do governo federal já dava a ideia do impacto do novo coronavírus sobre o emprego no Brasil: segundo o último balanço da Caixa Econômica Federal, 64,5 milhões de pessoas receberam o benefício, em pagamentos que somaram R$ 103,8 bilhões.

Mas, no fim de junho, a divulgação dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE, e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, deu a dimensão do cenário desolador que envolveu os trabalhadores brasileiros na crise. De acordo com especialistas, o retrato apresentado pelas duas pesquisas revela uma situação inédita no país – e não no bom sentido.

Segundo o IBGE, a taxa de desocupação no país nos meses de março, abril e maio deste ano superou a registrada no mesmo período do ano passado, e ficou em 12,9% – o que equivale a 12,7 milhões de pessoas desocupadas. Para especialistas, no entanto, o cenário é ainda pior do que o traduzido na taxa. Isso porque parte significativa da força de trabalho simplesmente desistiu de procurar emprego – e, com isso, ficou de fora da estatística.”

“O fenômeno pode ser identificado na diminuição da taxa de participação na força de trabalho – de 61,7% no trimestre que compreende dezembro, janeiro e fevereiro, para 56,8% nos meses de março, abril e maio de 2020 – e no crescimento da população desalentada. Segundo o IBGE, 5,4 milhões de pessoas deixaram de procurar emprego no mesmo período.

“Em qualquer crise, as pessoas saem do trabalho formal e vão para o informal. Correm atrás para fazer alguma coisa e gerar renda. Dessa vez, os dois tipos de emprego foram atingidos – e o informal perdeu mais ocupação que o formal. Nunca tínhamos visto nada parecido com isso”, analisa João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“No caso do emprego formal, a MP 936, do governo federal, não atingiu número esperado de trabalhadores, nem evitou a perda de renda.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
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A quantidade de pessoas que solicitaram o auxílio emergencial do governo federal já dava a ideia do impacto do novo coronavírus sobre o emprego no Brasil: segundo o último balanço da Caixa Econômica Federal, 64,5 milhões de pessoas receberam o benefício, em pagamentos que somaram R$ 103,8 bilhões.

Mas, no fim de junho, a divulgação dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE, e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, deu a dimensão do cenário desolador que envolveu os trabalhadores brasileiros na crise. De acordo com especialistas, o retrato apresentado pelas duas pesquisas revela uma situação inédita no país – e não no bom sentido.

Segundo o IBGE, a taxa de desocupação no país nos meses de março, abril e maio deste ano superou a registrada no mesmo período do ano passado, e ficou em 12,9% – o que equivale a 12,7 milhões de pessoas desocupadas. Para especialistas, no entanto, o cenário é ainda pior do que o traduzido na taxa. Isso porque parte significativa da força de trabalho simplesmente desistiu de procurar emprego – e, com isso, ficou de fora da estatística.

O fenômeno pode ser identificado na diminuição da taxa de participação na força de trabalho – de 61,7% no trimestre que compreende dezembro, janeiro e fevereiro, para 56,8% nos meses de março, abril e maio de 2020 – e no crescimento da população desalentada. Segundo o IBGE, 5,4 milhões de pessoas deixaram de procurar emprego no mesmo período.

“Em qualquer crise, as pessoas saem do trabalho formal e vão para o informal. Correm atrás para fazer alguma coisa e gerar renda. Dessa vez, os dois tipos de emprego foram atingidos – e o informal perdeu mais ocupação que o formal. Nunca tínhamos visto nada parecido com isso”, analisa João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Emprego informal diminuiu. Mas desta vez não foi um bom sinal
Segundo os dados do IBGE, o número de trabalhadores empregados no setor privado com carteira assinada caiu de 33,6 milhões na média de dezembro, janeiro e fevereiro para 31,1 milhões no trimestre que compreende os meses de março, abril e maio (-7,5%). Entre os trabalhadores sem carteira assinada, por outro lado, a queda foi de 20,8% (de 11,6 milhões para 9,2 milhões).

“A gente vinha torcendo para a informalidade cair, mas isso ocorreu às avessas. Caiu porque saiu muita gente do mercado de trabalho”, completa Saboia.

O maior impacto na informalidade veio por conta do isolamento social. Trabalhadores que antes viviam da venda de produtos ou da prestação de serviços viram o público sumir por conta do vírus. Além disso, as restrições de mobilidade diminuíram as possibilidades de busca de trabalho para as pessoas com menor instrução, que têm dificuldade em utilizar ferramentas online.

“O trabalhador desempregado que percebe essa dificuldade em alcançar as possíveis empresas em que conseguiria emprego fica em uma condição defensiva. Com o governo dando um alento por meio do auxílio emergencial, ele sabe que tem condições de aguardar um pouco para poder fazer a busca por trabalho”, diz José Roberto Ferreira Savoia, professor de Finanças da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP).

Na visão dele, entretanto, o fator que mais estimulou o desalento foi a intensidade da crise. “A minha sensação é de que as pessoas estavam muito mais preocupadas pelo fato de o desemprego ter sido muito rápido e em todas as regiões do país”, completa.

MP evitou demissões, mas saldo de vagas de emprego formal ficou no negativo
No emprego formal, por sua vez, o impacto da crise foi mitigado pela Medida Provisória 936, editada pelo governo federal em abril. Com o texto, as empresas ficaram autorizadas a fazer acordos de suspensão de contratos e de redução de jornada, com consequente diminuição dos salários, por dois ou três meses, respectivamente.

Nesses casos, o trabalhador recebe um auxílio do governo, chamado Benefício Emergencial, calculado de acordo com o seguro-desemprego a que teria direito. O Congresso já aprovou a prorrogação do programa por mais dois meses no caso da suspensão de contrato, e por mais um mês para a redução de jornada. O texto, porém, ainda aguarda a sanção do presidente Jair Bolsonaro.

Até agora, de acordo com o painel do governo, o programa registra mais de 12 milhões de acordos – menos que os 24,5 milhões de trabalhadores celetistas que estavam na estimativa inicial do Ministério da Economia. Com isso, houve a manutenção destes postos de trabalho, o que resultou no panorama menos severo na comparação com o mercado informal.

Mesmo assim, de acordo com os dados do último Caged, houve fechamento de quase 332 mil vagas de trabalho em maio. Somando os resultados deste mês com os de março e abril, o saldo entre contratações e demissões ficou em -1,48 milhão de vagas.

“Normalmente, a lógica em períodos de crise é de que o ajuste nas empresas seja feito por meio da demissão de pessoas. Dessa vez, o maior ajuste que ocorreu no setor formal foi nas admissões, que caíram muito. As demissões aumentaram, mas as contratações caíram muito mais – e, com isso, continuamos perdendo vagas”, explica João Saboia, da UFRJ.

A tendência fica clara quando é considerada a variação das admissões e dos desligamentos de um mês para o outro. Em abril, as contratações caíram quase 56% na comparação com o mês anterior, enquanto as demissões diminuíram somente 8,2%.

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Manutenção do emprego não impediu queda da renda
Há, ainda, um outro aspecto a ser considerado: a preservação dos empregos por meio da MP 936 não veio sem dor. Isso porque, entre os trabalhadores mais bem remunerados, a adesão das empresas ao programa do governo implicou em queda substancial da renda. Considerando os acordos de redução de jornada e salário, a perda pode variar entre 4,1% e 60% da remuneração, de acordo com a faixa salarial do trabalhador e com a modalidade do programa adotada pelo patrão.

“Esse tipo de medida foi adotado em vários países. É preciso garantir a renda e o emprego dos trabalhadores. O problema é que muitas vezes isso não ocorre, porque há uma redução muito grande do salário”, explica Rosa Maria Marques, professora de Economia da PUC em São Paulo.

Nos dados da Pnad Contínua, houve aumento no rendimento médio habitual das pessoas ocupadas, de R$ 2.374 no período de dezembro, janeiro e fevereiro para R$ 2.460 em março, abril e maio. A perda de renda, contudo, pode estar “camuflada” nos números, já que houve aumento da população desalentada e diminuição da informalidade, que tradicionalmente tem vagas com salários mais baixos.

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que se debruçou sobre os microdados da Pnad aponta, além disso, que a renda efetivamente recebida pelos trabalhadores em março, abril e maio de 2020 foi 5% menor que a habitual, de R$ 2.348.

“Usualmente, as análises de conjuntura focam a renda habitualmente recebida, pois esta não apresenta sazonalidade e é livre de variações idiossincráticas na renda efetivamente recebida. Normalmente, excluídos os efeitos da sazonalidade, na média ou no agregado, os choques individuais na renda efetiva se anulam, tornando os rendimentos efetivamente recebidos semelhantes aos habitualmente recebidos”, explicam os pesquisadores do Ipea.

O mesmo estudo aponta que, somente em maio, os rendimentos recebidos pelos trabalhadores corresponderam a 82% do que era habitual. Esse último cálculo foi feito com base nas informações da Pnad Covid-19, também do IBGE, que monitora os efeitos da pandemia no país com coletas de dados semanais.

Ainda de acordo com o Ipea, todos os trabalhadores foram atingidos pela redução dos rendimentos, mas a queda maior de renda ocorreu entre os que trabalham por conta própria (que receberam 60% do que ganhavam habitualmente) e aqueles sem carteira assinada (com renda efetiva equivalente a 76% do habitual). Entre os que têm trabalho formal, a renda recebida correspondeu, em maio, a 92% do habitual.

Há, por fim, uma outra ressalva ao programa instituído pela MP 936. Em alguns casos, as empresas preferiram demitir mesmo pagando a multa prevista no programa. Foi o caso da Nissan, que dispensou 398 funcionários da fábrica de Resende, no Rio de Janeiro, que já estavam com os contratos suspensos.

Retomada deve ser lenta, e depende de esforço para evitar falências
A deterioração dos indicadores do mercado de trabalho a partir de março tem, é claro, relação direta com a pandemia do novo coronavírus. Os especialistas salientam, porém, que a economia brasileira já não estava em ritmo acelerado antes da Covid-19. “A gente já vinha com a economia quase estagnada e com um nível elevado de desemprego. Já estávamos com o mercado informal representando 41% da força de trabalho antes do coronavírus”, diz Rosa Maria Marques, da PUC-SP.

Com a perspectiva de uma recessão profunda em 2020 – a estimativa do FMI, por exemplo, é de que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro caia 9,1% neste ano –, as previsões são de que o mercado de trabalho demore a se recuperar.

“O movimento da crise foi intenso, algo nunca visto no país. Acho que vamos ter alguma recuperação nos próximos meses, mas a tendência é de que a retomada seja muito lenta”, avalia João Saboia, da UFRJ. Ele salienta que a velocidade da recuperação depende, também, do comportamento da epidemia – e o número de novos casos e óbitos por Covid-19 não tem mostrado tendência de queda nas últimas semanas.

Para José Savoia, da USP, haverá, ainda, movimentos distintos de recuperação. De um lado, empresas que tiveram um bom desempenho durante a crise podem fazer reposições, procurando principalmente trabalhadores mais qualificados. Por outro lado, trabalhadores com menos escolaridade devem ficar mais submetidos à precarização das relações de trabalho e à informalidade.

“Há um número grande de empresas que vão fechar as portas durante a pandemia e não vão voltar. Com isso, o nível de desemprego certamente será mais alto do que no período pré-crise. O que temos que fazer é não deixar mais empresas quebrarem, dando a elas condições de crédito”, conclui o professor.

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