O corte de cargos comissionados anunciado pela equipe do presidente Michel Temer (PMDB) em maio de 2016 atingiu mais as mulheres que os homens e diminuiu ainda mais a participação delas no alto escalão do governo.
Levantamento feito pelo UOL com base em dados do Ministério do Planejamento mostra que, entre maio e novembro de 2016, apesar de homens ocuparem a maioria das vagas comissionadas do governo federal, o corte de cargos ocupados por mulheres foi de 12,13%, enquanto entre os homens foi de 8,46%. O maior corte nos cargos ocupados por mulheres fez a participação delas no alto escalão cair de 42,56% em maio de 2016 para 41,57% em novembro do mesmo ano. Em números absolutos, foram cortados 1.104 cargos ocupados por mulheres e 1.039 ocupados por homens.
Procurado, o Ministério do Planejamento afirmou que a queda mais acentuada nos cargos ocupados por mulheres é “meramente circunstancial”. A assessoria de imprensa da Presidência da República também foi procurada, mas ela não se manifestou sobre o assunto até a publicação desta reportagem.
O corte foi uma das primeiras medidas anunciadas pela equipe econômica de Temer, ainda em maio de 2016, quando ele assumiu a Presidência de forma interina após o afastamento de Dilma Rousseff (PT). O anúncio dava conta de que seriam cortados 4.000 desses cargos.
Dados do Ministério do Planejamento mostram que o governo federal fechou maio de 2016 (mês em que a equipe de Temer anunciou o corte) com 21.384 cargos do tipo DAS (Direção e Assessoramento Superior), que podem ser ocupados tanto por servidores de carreira quanto por pessoas sem vínculo com o funcionalismo público
Em novembro de 2016 (mês mais recente cujas informações estão disponíveis), o número total de comissionados havia caído para 19.241, uma redução de 10%.
Essa redução, porém, não foi linear e não atingiu homens e mulheres da mesma forma.
Dos 21.384 cargos DAS de maio de 2016, 12.281 (57,43%) eram ocupados por homens e 9.103 por mulheres (42,57%).
Em novembro, dos 19.241 comissionados, 11.242 (58,43%) eram ocupados por homens e 7.999 (41,57%) por mulheres. Ou seja: a participação das mulheres no alto escalão caiu aproximadamente 1%.
Numericamente, as mulheres perderam 1.104 (12,13%) dos cargos comissionados que ocupavam em maio de 2016, enquanto os homens perderam apenas 1.039 (8,46%).
Críticas: ‘visão sexista’ e ‘falta de equilíbrio de gêneros’
Uma das principais críticas feitas à equipe anunciada por Temer em maio de 2016 era a ausência de mulheres entre ministros. Foi a primeira vez que um gabinete foi inteiramente composto por homens desde o presidente Ernesto Geisel (1974 a 1979), durante o regime militar.
À época, Temer se defendeu afirmando que o pequeno número de mulheres em seu ministério seria culpa dos partidos políticos, na medida em que eles não teriam feito indicações de mulheres para os postos.
Mastrangelo Reino/Folhapress
A ministra Luislinda Valois, dos Direitos Humanos
O quadro foi atenuado após a nomeação de Grace Mendonça como advogada-geral da União e Luislinda Valois como ministra dos Direitos Humanos, pasta que havia sido extinta e que foi recriada em fevereiro deste ano.
Para a professora de sociologia e coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre as Mulheres da UnB (Universidade de Brasília), Lourdes Maria Bandeira, o corte maior nos cargos ocupados por mulheres é resultado de uma visão governamental “sexista” e que “desqualifica as mulheres”.
“Esse quadro mostra que este governo é profundamente sexista, porque ele reduz a presença feminina nos espaços de poder por entender que elas são menos importantes que os homens”, afirmou ela.
A professora Flávia Biroli, do Instituto de Ciência Política da UnB, diz que os números indicam que o atual governo não teria uma preocupação com a questão de gênero.
“Isso é resultado, provavelmente, da absoluta falta de preocupação com o equilíbrio de gêneros na ocupação dos cargos comissionados nesta gestão”, afirmou.
Biroli sustenta que, na medida em que as mulheres também são minoria no Congresso Nacional, a redução do espaço dedicado a elas nos cargos mais altos da administração pública representa uma ameaça a direitos conquistados por elas em anos anteriores.
“As conquistas mais recentes obtidas pelas mulheres eram frágeis porque a maioria não chegou a passar pelo Congresso Nacional, onde as mulheres também têm pouco espaço. Agora, com menos mulheres em posições de comando no [Poder] Executivo, essas conquistas ficam ainda mais fragilizadas”, explicou.
Outro lado: corte de mulheres foi “circunstancial”
A reportagem do UOL enviou e-mails e fez ligações para o Ministério do Planejamento e para a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto ao longo da última semana. Apenas o Ministério do Planejamento respondeu às perguntas enviadas.
De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento, as “nomeações citadas […] estão a cargo de cada órgão ou entidade que, no âmbito da reforma administrativa, fez escolhas internas, baseadas nos perfis a serem providas”.
Para o Ministério do Planejamento, “o fato de ter diminuído o quantitativo de mulheres ocupantes de cargos comissionados é meramente circunstancial”.