O Ministério Público (MP) do Paraná registrou, de janeiro a 29 de setembro deste ano, cinco casos de racismo e 179 de injúria racial. Os dados dizem respeito apenas aos inquéritos policiais que foram instaurados no Estado, a partir da comunicação ao órgão. Já em 2015, foram 400 crimes desta natureza [29 e 371, respectivamente].
De acordo com a promotora Mariana Seifert Bazzo, coordenadora do Núcleo de Promoção de Igualdade Étnico-Racial do MP, os números são subnotificados. “Os crimes não são devidamente investigados, os responsáveis não são punidos e isso se torna uma lacuna enorme até para se fazer as estatísticas. Não conseguimos vislumbrar um panorama de como são as violações e quais as políticas públicas que devem corresponder”, contou.
Como forma de combater ao menos parte do problema, a secretária especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luislinda Valois, do governo federal, se reuniu nesta semana com o governador Beto Richa (PSDB), no Palácio Iguaçu, em Curitiba. O objetivo foi tratar da implantação de uma delegacia especializada em atender ocorrências de racismo, intolerância e xenofobia. A ideia é acolher, além dos negros, o público LGBT (de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), idosos, pessoas em situação de rua e com deficiência.
“Ele [governador] nos garantiu que realmente vai ser instalada, quando não uma delegacia, pelo menos uma coordenação e a posteriori a delegacia. Já ficou tudo 100%, eu diria”, relatou a desembargadora. De acordo com ela, a data ainda não foi definida porque depende das agendas do presidente Michel Temer (PMDB-SP) e do Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. O crime de racismo, lembrou, é inafiançável e indiscutível.
“O povo negro do Paraná vai se sentir mais acolhido com esse espaço, para reclamar quando for discriminado. Infelizmente é uma constante se fazer isso com o povo preto. Aliás, sempre se diz que no Paraná não há negros. Mas há, e agora, com os refugiados do Haiti, aumentou. Hoje mesmo soube que a população negra é em média 28% [da do Estado, de pouco mais de 11 milhões]. É um número considerável, que merece um olhar muito bem voltado e trabalhado.”
Valois contou que existem estruturas do tipo em São Paulo, no Distrito Federal e em Minas Gerais. A daqui, contudo, seria a primeira de sua gestão. “Estou tentando criar em todos os Estados brasileiros (…) Também temos a certeza definitiva com o governador de Sergipe e com o do Maranhão. Não queremos trabalhar por partido, e sim para as pessoas”, completou.
Conforme a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp), o que foi encaminhado à Casa Civil não foi a criação de uma nova delegacia, e sim a proposta de implantação do Setor de Atendimento de Vulneráveis dentro da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). A pasta não informou se a estrutura será inaugurada ainda em 2016, nem quantos e quais profissionais irão compor a equipe. A FOLHA solicitou dados de atendimentos realizados e ainda uma entrevista com o secretário Wagner Mesquita, entretanto, não recebeu retorno até o fechamento desta edição.
Segundo Bazzo, as pessoas hoje não dispõem de um espaço para fazer as denúncias. “São vítimas de discriminação, de violência, às vezes policial, e chegam em determinadas delegacias, onde são dissuadidas a registrar. Se diz que aquilo não é exatamente um crime ou é uma injúria comum. Então, falta o acolhimento e essa formação temática, para que as pessoas possam efetivamente registrar e ver investigadas as condutas”, destacou.